Assim Mataram Adônis – OGS #126

por | mar 15, 2016 | Resenhas, Sem categoria

sarah caudwell

Aquele clima policial clichê, assassinatos, reviravoltas, advogados surpreendentemente liberais e Julia. Em Assim Mataram Adônis tem tudo isso e tiradas lindezas <3

Sinopse: A aventura começa quando a bela e desastrada Julia Larwood, ex-aluna e colega de trabalho de Tamar, decide tirar férias em Veneza na intenção de fazer passeios culturais, saborear a culinária e por em prática seu método pouco ortodoxo de sedução, baseado em uma leitura superficial do poema “Vênus e Adônis” de Shakespeare. Poucos dias depois, Tamar e seus colegas do Lincoln´s Inn. recebem a notícia de que Julia foi presa pela polícia italiana, acusada de matar Ned, o Adônis que havia seduzido.
O desenrolar dos fatos se dá pelas cartas de Julia à sua amiga Selena e pelas deduções dos demais barristers, sempre guiados pela figura de Tamar. Dessa forma, a narrativa se desenvolve em contraponto entre as cartas carregadas da franqueza ingênua de Julia e os comentários irônicos e divertidos de seus amigos enquanto leem. É desse contraponto que o mistério surge e é levado a um grau altíssimo de tensão. (sinopse da contracapa)

Achei esse livro naquela feirinha lindeza que fica na rodoviária de SP, eu ia ficar mofando por um tempinho por lá, então tentei achar algo que desse aquela preenchida no tempo (e evitasse de pessoas começarem a puxar papo, já estava exausta de interação social, confesso). Havia alguns com essa temática policial, aí deu aquela saudade de livros mais simplões que criam aqueles mundos cheios de mistérios e assassinatos que você fica frenético pra descobrir. Li a sinopse de Assim Mataram Adônis, achei bizarríssima e pá. Comprei.

Até postei no Insta  no dia 8 que seria uma recomendação legal para ler… e já te conto o porquê.

O livro é da Sarah Caudwell e é lá de 1981. Presume-se então que um moooonte de tecnologias, com o advento do telefone celular, internet, email, nada disso tinha. Presume-se também com a arrogância de uma contemporaneidade que alguns costumes e preconceitos existiam. MAS. Fiquei bem chocada quando vi que a liberdade feminina é retratada de forma tão natural naquele grupo de amigos advogados.

“Ela gosta, bem sei, de fingir que Julia é uma mulher adulta normal, que pode ser mandada em segurança até a esquina para comprar pão; mas é claro que isso é absurdo. A incapacidade da pobre Julia para entender o que está acontecendo, ou por quê, no mundo que a rodeira, sua incompetência para aprender até mesmo as habilidades práticas mais simples necessárias para a sobrevivência devem ter evidenciado, já na infância, que ela nunca seria capaz de lidar, sem ajuda, com as responsabilidades plenas da vida adulta. Ela deve ter sido, sem dúvida, uma criança dócil e de boa natureza, com certa facilidade para verbos latinos e testes de inteligência – mas de quê serve isso para alguém?”

Assim mataram Adônis, Sarah Caudwell, p. 15

Quando Julia vai para Veneza, inconformada pelo funcionamento da Receita Federal, ela diz claramente que sai em busca de prazeres da carne. Eu fiquei “oi? A Julia fala isso abertamente pro círculo de amigos láaaaa na década de 80? Inclusive pros amigos homens?” Aí ao longo do livro você também fica sabendo que ela já desfrutou de tais prazeres com ambos os homens do círculo. E está tudo bem, tudo ok, tudo aceitável e ninguém a julga como uma moça promíscua ou algo do tipo, mas sim como alguém que gostaria de matar uma vontade de sorvete e foi até a sorveteria.

“Minha entrada no barco deu-se em um ângulo mais obtuso do que perpendicular ao cais e a uma velocidade mais rápida do que graciosa. Em resumo, eu caí de cabeça.” (Julia)

Assim mataram Adônis, Sarah Caudwell, p. 49

Confesso que fiquei muito surpresa com isso. Claro que há personagens que acham que tudo que uma mulher tem de querer para atingir sua realização de vida é casar. Mas essas pessoas são expostas como retrógradas e limitadas.

Esse grupo de amigos que exalam aquela vibe britânica (com certeza eu teria pego mais referências se conhecesse a Londres dessa década, cheia de trânsito e costumes específicos) é um dos mais carismáticos. Ragwort com seu jeito específico e britânico estereotípico; Cantrip com alguma questão de um preconceito londrino com quem é de Cambridge, e as safadezas usais (eu ainda quero saber o que realmente aconteceu com a situação da aranha); Serena sempre precisa e Hilary. Que não se sabe até hoje se é um homem ou uma mulher (nessa tradução transformam a professora Lamar em mulher, no inglês tudo é sempre impessoal, ahhh, as possibilidades do inglês…), mas é aquela figura de conhecimento pleno, e muitas… muitas…. muitíssimas piadinhas e inferências que só um narrador consegue fazer.

“E o major, ouvindo que sou parente de um irmão em armas, vai me abraçar. Metaforicamente, quer dizer, porque esta é uma cena inglesa e masculina.” (Cantrip)

Assim mataram Adônis, Sarah Caudwell, p. 213

É muito divertido ver as noções bizarras e entendimentos divergentes que Julia consegue fazer. Ela racionaliza tudo, com uma lógica um tanto quanto questionável, e tudo começa a dar errado de forma excelente. HAHA

“Tenho um incidente curioso, e possivelmente sinistro, a lhe relatar. Talvez possamos chamá-lo de O Fenômeno do Major Recorrente.” (Julia)

Assim mataram Adônis, Sarah Caudwell, p. 142

As cartas dela são muitíssimo criativas, ela é uma moça muito inteligente só que com um julgamento da vida real bem complicado. O que dá um equilíbrio estranho. É interessante conhecer Julia somente pelas cartas e realmente só ver uma interação real entre os outros personagens que vão aparecendo. Tanto que ela não aparece em instante algum, nem no final do livro.

Aliás… quanto plot twist nesse livro. Por mais que Hilary te diga que não vai ser uma solução de mistério estilo foi o mordomo, você fica “MEO DEOS, se não é isso, QUE QUE ÉEEE?” de tantos impasses. hahaha

O que entra na minha consideração de um livro bom. hehe
Foi uma leitura agradabilíssima, cheia de piadinhas do estilo que gosto e fez o tempo passar lindamente <3
(e ainda deve ter na feirinha por 10 reais, fiquem espertos quem puder!)

Assim Mataram Adônis
Autores: Sarah Caudwell
Editora: Tordesilhas
Páginas: 228
cinco estrelas

 

 

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