Em O homem que caiu na Terra, Tommy pousa aqui com uma missão: a de deixar a gente arrepiadamente deprimido nessa ficção de Walter Tevis…
Sinopse: O Homem que Caiu na Terra tornou-se um verdadeiro clássico da literatura e uma das mais refinadas, sutis e delicadas ficções científicas já escritas. Publicado originalmente em 1963, ganhou reconhecimento em todo o planeta com a adaptação para o cinema dirigida por Nicolas Roeg em 1976. O filme também marcou a estreia de David Bowie no cinema encarnando o protagonista alienígena – para quem o papel parecia ter sido especialmente pensado (o que não foi o caso): um ser andrógino, impúbere, alto para os padrões terráqueos, delicado, magro, polido e que tenta se adaptar à vida terrestre para sobreviver entre os humanos.
Thomas Jerome Newton veio de Anthea para a Terra em uma missão desesperada para salvar os poucos habitantes que ficaram em seu longínquo e desconhecido planeta. Para isso, precisa construir aqui uma nave que possa trazer os 300 de sua espécie que ainda vivem em um planeta onde a água acabou e os recursos são cada vez mais escassos.
Com conhecimento e inteligência muito superior aos humanos, Newton logo se torna um bem sucedido empresário do ramo de patentes tecnológicas e também descobre a solidão, o desespero e o álcool – criando uma delicada parábola sobre as mudanças que estavam ocorrendo entre os anos de 1950 e o início da Guerra Fria.
Escrito com vigor e com uma prosa carregada de tensão poética, Walter Tevis produziu uma das ficções científicas mais realistas sobre um alienígena que vai absorvendo o dia a dia, o jeito e os vícios humanos pouco a pouco. Realista o suficiente para se tornar uma metáfora daquilo que todos nós carregamos: uma indescritível angústia e solidão existencial. (Sinopse do skoob)
E só de sentar pra escrever a resenha já me bate uma tristezinha. HAHA
Aiai, comprei o livro numa promoção da Amazon LOKA (não assisti ao filme até hoje, então a resenha vai se centrar exclusivamente na trama do livro), mas admito que comprei porque o dyvo Bowie estava envolvido (e a capa é toda lindosa, né, com aquele laranja de deixar a gente meio tonto).
“O cargo do professor Canutti era de coordenador e conselheiro departamental, o que é mais ou menos o título da maioria dos chefes de departamento hoje em dia, desde a época em que a grande mudança de nomenclatura transformou todos os vendedores em representantes de campo e todos os faxineiros em zeladores. Essa mudança demorou um pouco mais para alcançar as universidades, mas o tempo chegou e hoje em dia não há mais secretárias, apenas assistentes e auxiliares administrativos; não existem mais chefes, apenas coordenadores.”
O homem que caiu na Terra, Walter Tevis, p. 53
Demorei um pouco pra ler, a trama é toda meio deprê, com toques violentíssimos sobre como somos como humanidade, nossas falhas, nossos egoísmos, prepotências e aquela visão bem pessimista com a perspectiva da Guerra Fria e futuro (o livro é de 1963, então dá pra entender o porquê de tudo isso, as distopias mais incríveis e visionárias são dessa época, o pessoal devia ter um clima de “o mundo vai acabar” a todo instante, o medo de guerra química e assim vai).
“Quão sábias essas malditas crianças eram? Foi quando se lembrou do próprio papo-furado que declamava durante o ano em que tinha se formado em Literatura, quando tinha seus vinte e poucos anos: “níveis de significado”, “o problema semântico”, “o nível simbólico”. Bem, havia um monte de substitutos para o conhecimento e a sabedoria, metáforas falsas por todos os lados.”
O Homem que caiu na Terra, Walter Tevis, p. 42
Tem trechos simplesmente excelentes, e Tommy vai ficando cada vez mais humano, cada vez mais suscetível às mazelas da humanidade. Eu não pude deixar de traçar um paralelo de como seria se o Doctor (de Doctor Who) não tivesse seus companions, a Tardis, as suas aventuras focadas na sua fuga constante (se bem que ele usa suas aventuras da mesma forma que Tommy acaba usando o álcool…). O quanto conseguimos tolerar antes de entrarmos em parafuso? Antes da depressão bater e compensarmos em algo?
“Uma espaçonave erguida em uma pastagem do Kentucky, cercada por montanhas outonais e cujo dono era um homem que escolhera viver em uma mansão com uma empregada bêbada, um secretário francês, papagaios, quadros e gatos. Entre a nave e a casa ficavam a água, as montanhas, o próprio Bryce e o céu.”
O homem que caiu na terra, Walter Tevis, p. 100
O livro todo vai percorrendo essa vibe pessimista, essa desilusão com a humanidade, com os humanos, com o caminho que seguimos (ou deixamos de seguir). E no meio disso tudo, temos alguns humanos de destaque: Betty Jo e Dr. Bryce.
A Betty Jo é aquela figura americana que você desvia o olhar, aquela mulher quarentona, com problemas de alcoolismo, viúva, que não liga mais pra se cuidar e vive de pensão do governo. E se torna a melhor companheira pro Tommy.
“Se você fosse de Marte realmente estaria sozinho”, disse Bryce, observando os patos. Se ele fosse de lá, seria como um pato solitário no lago – um migrante cansado.
“Não é preciso.”
“O que não é preciso?”
“Ser de Marte para se sentir sozinho. Imagino que você já tenha se sentido sozinho muitas vezes, dr. Bryce. Se sentido alienado. Você veio de Marte?”O homem que caiu na Terra, Walter Tevis, p. 106
E também temos o Bryce… eu honestamente vi muito do jeito que penso, ajo, no Bryce. HAHA Principalmente a desilusão dele com a Academia, essa vibe de ter de reestruturar a vida e tudo o mais. Bryce is my spirit animal. Tirando o alcoolismo, claro. HAHAHA
A leitura, mesmo me dando as bad vibes, é super fluida, a edição ficou uma beleza, as aberturas dos capítulos servindo como uma metáfora da nave saindo de Anthea e chegando na Terra, tudo com trechos da própria tipografia do título (os tizainer pira. HAHA). Ainda fico refletindo aqui quietinha, até enquanto escrevo essa resenha de como era o clima daquela época (já que o livro se passa no futuro idealizado do Tevis, um futuro onde existe um EUA praticamente totalitário, quase uma URSS, o que achei maravilhoso, aliás, um livro onde os EUA são o vilão, e não a URSS hahaha) e de como ele imaginava que tudo seguiria (o Brasil é até mencionado como fornecedor de café, e o que acontece quando essa parceria acaba). Minha única questão pra isso seria: leiam.
“(…) Às vezes, vocês nos parecem macacos soltos em um museu, correndo com facas, rasgando os quadros e quebrando as estátuas com martelos.”
Bryce não conseguiu falar imediatamente. “Mas foram os humanos que pintaram os quadros e fizeram as estátuas.”
“Apenas alguns humanos”, respondeu Newton. “Apenas alguns.”O homem que caiu na Terra, Walter Tevis, p. 162
O homem que caiu na Terra
Autores: Walter Tevis
Editora: Darkside
Páginas: 224
Aqui você confere todos os trechos selecionados no Tumblr 🙂
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